30 de dezembro de 2008

Uma miragem torna-se realidade em São Francisco de Paula

Os dicionários relacionam miragem com ilusão. Um viajante está morrendo de sede no meio do deserto e tem a nítida impressão de que ali adiante existe um oásis. Avança em direção ao lugar onde pensa haver água, mas descobre que não passa de uma ilusão de óptica: uma miragem.
Para quem gosta de livros, existe em São Francisco de Paula, na serra gaúcha, um oásis que tem o paradoxal nome de Miragem.
São Chico é minha cidade preferida na serra. Tem a vantagem de não parecer um shopping center como Gramado e Canela e ainda contar com o clima especial de montanha e a beleza dos campos de cima da serra. Mas também é verdade que São Chico lembra mais uma pacata cidade do interior do que uma cidade turística. Não há muitas opções gastronômicas nem culturais. Nesse cenário, surpreende encontrar uma livraria como a Miragem, que já virou um dos principais pontos turísticos da cidade. Não se trata de um empreendimento de gente de fora. É iniciativa de uma moradora da cidade, a professora Luciana Soares. Luciana pertence a um gênero raro de pessoas que conseguem ser sonhadoras e dar forma e vida a seus sonhos.
Só o prédio da livraria, localizada na avenida principal da cidade, já vale a visita. É uma construção que une tijolos e madeira, feita sob medida para abrigar a livraria, um café e um espaço para exposições (reconstrução de um prédio antigo da cidade). Todas as dependências foram construídas para permitir o acesso a pessoas com dificuldade de locomoção.
Quem pensa que ir à livraria é um programa para adultos logo vai se surpreender. O espaço para as crianças é maior do que o reservado ao público infantil em muitas das grandes livrarias de Porto Alegre. E o acervo diferenciado inclui livros, jogos e brinquedos que valorizam e desenvolvem a inteligência das crianças.
Para o público adulto, há um pouco de tudo. Só lamento que boa parte da livraria seja dedicada aos temas místicos, desde religiões até auto-ajuda. Meus interesses são outros, mas é preciso reconhecer que livros sobre esses assuntos atraem grandes públicos. Ainda assim, muitas estantes estão reservadas a outros temas como história, viagens, gastronomia, psicologia, educação, ciências, literatura brasileira e universal. Neste final de semana, adquiri lá O Erro de Descartes, de António Damásio, e O Relojoeiro Cego, de Richard Dawkins - obras que se situam no extremo oposto aos livros de auto-ajuda.
Se vocês amam os livros e forem à serra gaúcha, sugiro que não se limitem a Gramado ou Canela. Passem em São Francisco de Paula ou se hospedem lá (no Veraneio Hampel, no Hotel das Araucárias ou na Pousada do Engenho, por exemplo) e reservem uma ou duas horas para visitar esse oásis de cultura que se chama Miragem.

6 de dezembro de 2008

Escutar rádios de todo o mundo no celular

Eu não sei se você é, como eu, um aficcionado por rádio. Eu sou - desde que me conheço por gente. Cresci ouvindo noticiários e jornadas esportivas que minha mãe e meu pai acompanhavam num velho rádio a válvula, nos fins dos anos 60 e início dos anos 70. Quando adolescente, curti um pouco do FM, mas sempre me interessei mais pelo AM e pelas ondas curtas.
Aprendi a falar razoavelmente bem o espanhol de tanto escutar, à noite, rádios argentinas e uruguaias escondidas no dial. Além de jogar futebol e botão ou devorar livros, parte de minha infância e adolescência era dedicada à experiência de descobrir rádios bem distantes, seja nas ondas médias, seja nas ondas curtas. Não foi por acaso que, enquanto cursava a faculdade, decidi trabalhar numa rádio.
Quando as rádios começaram a transmitir pela internet, no final dos anos 90 e início deste século XXI, senti que a realidade superava o sonho. Como era possível escutar com som local rádios de lugares tão distantes como Luanda, Anchorage ou Adelaide? Logo me tornei um caçador de rádios na Internet, que escuto hoje muito menos do que gostaria em função de uma frenética e exaustiva rotina profissional.
Alguém poderia pensar: por que escutar rádios de outros países? Ora, há quem esteja longe de sua terra e sente vontade de acompanhar as emissoras de sua cidade. Não é o meu caso, que moro hoje na mesma cidade em que nasci. Minhas razões são outras: rádios de outros países são ótimas oportunidades para se aprender sobre lugares distantes e se familiarizar com outras línguas. Quem gosta de estudar outros idiomas e de conhecer outras culturas sabe do que estou falando.
Mas, apesar do incrível avanço tecnológico registrado em tão poucos anos, havia ainda uma fronteira a ser desbravada no universo das rádios via web: a mobilidade. Havia. A tecnologia 3G permitiu que esse novo limiar fosse rapidamente alcançado. As rádios do mundo inteiro podem estar agora na palma de nossa mão, em qualquer lugar, andando com a gente.
Aparelhos de diferentes marcas estão vindo equipados com programas que permitem sintonizar rádios dos mais diversos recantos da Terra. Por exemplo, a Nokia desenvolveu um programa chamado Nokia Internet Radio. Esse aplicativo já vem configurado para acessar cerca de 1500 rádios. Poucas são do Brasil. Quase mil são dos Estados Unidos. Há boas opções de rádios européias. O melhor: é possível acrescentar manualmente outras emissoras, bastando para isso que se informe o endereço da transmissão de áudio. O problema é que muitas rádios fazem suas transmissões usando um formato que somente pode ser lido pelo programa Windows Media Player, que não roda em aparelhos cujo sistema operacional é o Symbian, como é o caso do meu Nokia N95. Apesar disso, é possível escutar no meu celular emissoras como a Soma FM, com seus ambient beats, a Duna FM, do Chile, as diversas rádios locais da BBC, ou a WBBM, uma rádio de notícias de Chicago, entre tantas outras. Várias dessas emissoras transmitem em estéreo, com qualidade de CD. É possível andar pela casa escutando essas rádios sem que o sinal caia uma única vez. Mesmo no carro, o sinal se mantém como se fosse uma emissora local. No meu Nokia N95, é possível escutar as rádios pelos pequenos alto-falantes na lateral do aparelho. Até que o som é bastante bom para um aparelho celular: parece o áudio de um pequeno rádio FM. Há obviamente a opção do fone de ouvido, mas uma excelente opção é um dispositivo da Nokia que funciona como caixas de som portáteis conectadas com o celular por bluetooth: são as caixas de som Nokia MD-5W, do tamanho de um rádio portátil.

Com aparelhos assim, as rádios da internet se liberam dos computadores: andam conosco pela casa, podem nos acompanhar na hora de fazer a barba ou na mesa do café da manhã. Podem mesmo ser escutadas na caminhada matinal.
Há momentos em que todos nós precisamos de silêncio. Na verdade, necessitamos de mais silêncio do que nos concedemos em nossas vidas. Mas também é bom poder estar ligado ao mundo, é prazeroso descobrir como pensam pessoas de lugares distantes: quais são seus problemas, quais são suas soluções para esses problemas, o que nos aproxima deles, o que deles nos distancia, como expressam seus receios e desejos.
Os aparelhos celulares que permitem conexão com a internet em alta velocidade e os pacotes de dados ainda estão relativamente caros, mas é só pensar um pouco para perceber que em breve toda essa tecnologia vai estar bastante acessível a quase toda a população. Lembrem quem tinha celular em 1994 e vejam quem tem hoje: o barateamento e a conseqüente universalização desse tipo de tecnologia dependem apenas do tempo. Então a grande questão que ficará para cada um de nós é decidir com que finalidade vai usar (se é que vai querer usar) tanta tecnologia, tanta potencialidade. Eu vejo encanto em tudo isso e penso não estar sozinho.